Manuel Correia Machado nasceu em casa, no dia 29 de maio de 1950, tem 67 anos. Vive nos Arrifes. Quando tenha 21 anos foi obrigado a ir para o ultramar, para a guerra. "Fui obrigado a ir e quem tinha dinheiro pagava e ficava atrás e ia outro em seu lugar. Não me arrependo, porque chegou a minha vez. Estive no Quartel da Castanheira e quando acabou fui transportado para a rua do Outeiro e de lá embarquei para o continente para treinar. Fiquei 3 ou mais meses para treinar no Quartel de Belém na Calçada da Ajuda.
Tive quatro acidentes, mas consegui sobreviver. Fiquei 3 meses no hospital. Vi um amigo africano a morrer de arma automática, levou com um tiro na testa, que saiu pela nuca. Ele acabou por morrer ao meu lado. Fiquei respingado de sangue. Vi amigos morrerem com a cabeça num ferro até as cabeças secarem.
Vestia roupa camuflada, as comidas eram atum, sardinhas, carne moída... tudo enlatado, barras de queijo, marmelada. Não havia pão. Os sumos eram de lata... de laranja e de pêssego.
Dormia-se no mato 3 a 4 dias e depois regressava-se. No inverno passava as noites em estradas sem saber para onde ir. Para voltar para a base andava nos rios, todos juntos... horas e horas andando. Nos dias andávamos de mãos dadas e com cordas amarrados. Para descansarem à noite ficavam dois de vigia e os outros cobriam-se com uma manta.
Vi leões, tigres... não nos podíamos mexer. De animais vi elefantes, jibóias, cobras pequenas venenosas, hienas, leopardos, jacarés, hipopótamos, girafas, camaleões de várias cores, macacos, gazelas, javalis, zebras, búfalos, rinocerontes e outros.
Fomos atacados duas vezes no quartel sobre o amanhecer. Uns ficaram cegos, outros sem membros e outros morreram. Quem atacava eram os turras.
Bebíamos água parada com bichos, quando não havia água bebia a própria urina.
Em algumas zonas passamos muita sede, pois havia muito calor. Passei por Angola (aeroporto de Luanda) e fui para Moçambique. Antes de Vila Cabral fui de avião para a cidade da Beira, onde sai com armas carregadas, de comboio para a cidade de Nampula e depois para Vila Cabral... sempre de comboio e fomos para o quartel.
Tudo terminou em 25 de abril. Voltei para a minha terra em 1974. Os Açores.
Hoje em dia tenho pesadelos.
Atualmente trabalho nos serviços agrários de S. Miguel. Não melhorei a minha vida
Recolha de Natércia Santos, a neta do senhor Manuel, aluna do 6º ano, turma D.
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